No final do corredor a janela de vidro, nela escorria a parte inocente da chuva que caía naquela tarde de sexta-feira, e eu no anfiteatro da escola no intervalo de uma divertida aula de teatro...
Minhas amigas e eu fazíamos ‘porquinho’ no vidro da janela embaçado enquanto a chuva escorria devagar, e depois ríamos muito feito umas bobas sentadas no canto da parede...
Ah, meus catorze anos! Era tão divertido, tão colorido, tínhamos sonhos pequenos que eram sonhados em cochilos de vinte minutos quando encostávamos uma nas outras no intervalo das aulas de teatro ali no cantinho da parede, e eram sonhos tão sonhos, que ao menos sei explicar direito, enfim, eram nossos pequenos sonhos de meninas que escondiam as mãos geladas debaixo de uma blusa de moletom azul!
“Garotas, acordem agora uai!” Nossa melhor diretora de teatro sempre dizia, e sem esquecer que o professor sempre será um “fofo”.
Ainda me lembro do cheirinho de chuva quando acordava assustada do cochilo e respirava fundo e espreguiçava e coçava meus olhinhos que tinham muita vontade de se fecharem outra vez e continuar sonhando com o que me parecia tão real...
Então subíamos as escadas apostando quem chegaria primeiro e meu fôlego era enorme naquele tempo, hoje, já não sei se fico trinta segundas debaixo d’água na piscina.
Fôlego? Talvez esta fosse a palavra certa, porque precisávamos ir correndo uns treze quarteirões e voltar em menos de uma hora e meia para o colégio. Por quê? Vou te contar, mas é segredo viu?! Eu e minhas amigas do coração, as meninas mais cor de rosa da escola e as mais legais, claro, pois não poderia ser diferente, saímos uma a uma, meio que fugidas da aula de teatro naquela tarde de sexta-feira após o intervalo, quando o professor resolveu passar um filminho e se apagaram todas as luzes...
Curiosos para sabe aonde fomos? Será que eu conto? Yeah, vocês sempre vencem não é mesmo? Vou contar então, eu e minhas amigas corremos muito debaixo de chuva e de uniforme escondido pela blusa de moletom azul, corremos até um lugar estranho onde acontecia uma festa legal todo sábado a tarde e o problema era que a minha mãe e a mãe das meninas eram muito chatas, imaginem, elas não deixavam a gente ir todos os sábados, mas quem poderia deter as super amigas? Yes, nós tínhamos um plano G!
Porque não um plano B? Porque G ficaria mais difícil de alguém descobrir o que era a letra B é a segunda letra do alfabeto e então na segunda tentativa alguém acerta, mas, se erra, até a G não vão ter mais paciência para tentar... Complexo? Mas era um raciocínio lógico, ou melhor, você que pediu pra que eu explicasse isso...
Conseguimos chegar ao lugar onde se pega cortesias para a festinha de sábado e por coincidência, encontramos dois amigões da escola, o Giorgio e o Stefano.
Eles riram muito porque estávamos todas molhadas iguais àqueles monstrinhos de um dos primeiros filmes que o Leonardo Di Caprio fez na vida, aqueles monstrinhos que eram bolas de pelos e corriam atrás das pessoas e eram simplesmente horríveis.
Eles ofereceram carona, estavam com um primo de carro e isso seria muita sorte se o menino que veio nos entregar as cortesias não fosse... Você sabe quem, agora não posso falar!
Então aceitamos a carona até o colégio e isso diminuiria muito as chances de termos um resfriado, e também a longa caminhada de volta, claro, sem dizer; que o menino só poderia ser o que eu estava muito afim de encontrar mas não toda horrível, ensopada pela chuva, enfim, eu era muito menina para saber que um banho de chuva que destrói sua fisionomia é algo normal nos melhores romances e por que?
Talvez porque ter alguém para se preocupar com o seu resfriado no outro dia, aumente as chances de vocês se aproximarem alem de provar que existe um sentimento ali escondido no coração, claro, isso é fato, é verdadeiro porque se por um acaso não houvesse sentimento algum tudo já teria literalmente ido por água abaixo, pois, um banho de chuva é mais do que suficiente para te deixar desprezível...
Ao chegar ao colégio agradecemos muito a carona, nossa foi bem-vinda na hora certa, e até tinha dado pra se secar um pouquinho, porém, o frio estava de arrepiar tudo...
Eles foram embora e nós ficamos olhando uma para a cara da outra com quem diz, e agora o que fazer?
Naquele minuto eu não podia pensar em muitas coisas, eu era mais do que nunca apenas uma pata molhada e minhas amigas? Amigas patas e molhadas, apenas isso!
De repente a mãe da Dani chegou e assustada já foi dando um sermão na nossa queridinha pata molhada número um, porque era a mais baixinha e eu simplesmente sorri com ar de menina sapeca e disse com muita coragem; ‘Tia Raquel amanhã a Dani pode ir ao cinema com a gente?” Fechei os olhos e abri rapidamente, e antes que ela dissesse não porque estava muito brava, eu e minhas outras amigas com carinhas de menininhas pidonas, dissemos; ‘Ah, deixa por favor!” E a mãe da Dani que não era irredutível e gentil disse que ia pensar e disse que a Dani ligaria pra gente a noite. Elas foram embora e eu e as meninas gritamos; ‘yes’! Aquilo significaria um ‘sim’, a Dani iria ao cinema com a gente amanhã e o plano G daria certo!
Novamente olhamos umas para cara das outras, e foi quando a Lola deu tchau e foi pra casa, a Fefa, a Lara e a Carol a mesma coisa...
Chelly e eu ficamos rindo, sentadas no meio fio e chupando laranjinhas de frutas tropicais super felizes e de bem com a vida, pensando muito bem no que fazer amanhã...
De repente surge a irmã da Chellynha e a minha prima com um interrogatório enorme, do qual nem prestamos atenção a não ser na última pergunta que era onde nós estávamos e advinha o que eu e a Chelly respondemos? Claro que a resposta foi; na aula de teatro!
Tudo bem, logo a mãe da Chellynha chegou e ela foi embora, então voltei para casa que na verdade era a casa da minha prima e eu ia dormir lá como de costume na sexta-feira, último ano sem aulas pelas manhãs de sábado então era mais do que essencial se divertir não é mesmo?
Minha prima querida do meu coração que muito sabia que eu estava com um segredinho com a Chelly e possivelmente mais amigas envolvidas em toda a trama, simplesmente chegou em casa, e conversou com a minha tia um assunto qualquer, enquanto eu corri para o banheiro e troquei de roupa para não muito explicar porque eu estava tão molhada.
Depois saímos com o cachorrinho para dar uma voltinha naquela sexta-feira à noitinha...
Fomos para a pracinha, e eu fiquei olhando as gotinhas de chuva nas árvores, nas plantinhas e segurando o cachorrinho enquanto a minha prima conversava com um amigo dela que lhe entregava uma cartinha e amor...
Algum tempo depois, voltamos fomos até o posto comprar ‘keep cooler’ de uva, beber e falar umas porcarias.
Ela me perguntou se eu não ia assumir o que ela já sabia e o que eu mais do que ninguém também sabia. E eu fiquei meio atônita e mudei de assunto, logo ela me contou que amanhã ia numa festa de quinze anos e me convidou para ir com ela e eu perguntei que horas ela ia?
Porque eu poderia ir para a matinê que era o suposto cinema e até no máximo dez horas eu voltava e então íamos à festinha de quinze anos também.
Minha prima muito esperta disse que ás dez horas e eu fiquei perplexa porque era a chance de ver você sabe quem por mais tempo e ela sabia disso e ela não iria ás dez horas em ponto, mas como eu não respondi com todas as palavras o que ela queria tanto ouvir para poder ter o gostinho de dizer; ‘ eu sempre soube’, e depois rir...
No entanto eu não entreguei o jogo para minha prima-irmã, e disse que seria muito bom se pudéssemos ir ás dez e meia porque ai daria tempo para que eu chegasse e tomasse um banho legal e colocasse um vestido bem bonito.
Ela disse; ‘ me conte o seu segredinho que a gente pode entrar num acordo’. Outra vez eu estive atônita com a minha prima, nesse momento tentei ser esperta embora ela já soubesse de tudo, mas, o gostinho da ironia ela não teria por agora e talvez ainda demorasse alguns anos se acaso disso ela não esquecesse, mas a minha prima? Adora uma boa gargalhada!
Olhei nos olhos dela com um ar menina apaixonada que escondia um segredinho mesmo e disse; ‘ Vamos a matinê ao invés de irmos ao cinema e se você quiser ir...’
Ela pensou menos que um minuto inteiro e disse que estava combinado!
Voltamos para caso e tínhamos um segredo, pela madrugada até mais ou menos umas duas da manhã, sem acordar a minha tia, nós ligamos o computador para entrar numa sala de bate-papo e eu de pijama e pantufas cochilei...
De repente ela me acorda rindo, e fala baixinho; ‘ Mila, ele vai estar na matinê e na festinha de quinze anos...’, e eu olhei com ar de sono, muito sono para minha prima que tinha acabado de desligar o computador e já estava me puxando para irmos dormir...
No outro dia pela manhã acordamos super felizes, fomos ao supermercado com a minha tia, voltamos e fomos ao cinema num shopping perto da matinê, sinceramente nós duas parecíamos duas alienígenas horríveis porque estávamos muito coloridas, mas, essa era a moda naquela época, então meu tio mal foi embora e a gente pegou um táxi para a matinê.
Lá foi super legal, eu encontrei todas as minhas amigas, tudo deu muito certo, o nosso plano G era poderoso, não tinha como falhar e a única coisa que aborrecia era que eu gostava muito da companhia das meninas e ás vezes elas não me ajudavam muito com algumas coisas, com exceção da Chellynha que nunca deixou de me entender em momento algum e ela também tinha um segredo a parte e eu também, era assim, as meninas não sabiam quem era o menino que a Chelly era afim lá e nem o que eu era afim...
Ás vezes ficava um clima como se estivéssemos tirando as meninas, mas, não era bem assim, só não podíamos contar sempre tudo para todas as amigas não é mesmo?
Ah, e sabe de uma coisa? As meninas sempre pegavam um monte de meninos nessa matinê, eu e a Chelly éramos muito críticas, acho que por isso que nós sempre paqueramos os meninos errados, e nunca tivemos chances com os certos naquele lugar...
Mas por outro lado era muito divertido, pode parecer infantil, mas o que seria da literatura se ela não pudesse ser um pouco agridoce e relatar coisas infantis?
Nada seria assim como nada seria de mim e da minha prima se não voltássemos ao shopping a tempo do meu tio pensar que estávamos mesmo no cinema.
Conseguimos, fomos muito inteligentes e nossa estratégia deu tudo muito certo, embora eu tivesse que me ausentar trinta minutinhos mais cedo do plano G e as meninas terminaram de executá-lo sozinhas e foi um grande sucesso, o nosso cinema que era matinê apenas foi descoberta agora esses dias para trás que alguém contou antes que eu escrevesse tal história...
Voltamos para casa muito sérias, e meu tio meio desconfiado, e nada falava porque no fundo ele sabia que a vida também deveria ser feita de aventuras e ele confiava muito na gente porque sempre fomos muito responsáveis...
E o que poderia dar errado?
Chovia muito, muito lá fora e então ficamos com medo de não podermos ir a festinha, mas, a minha Tia do meu coração estava com um humor bom e disse apenas para esperar a chuva passar um pouco, e foi o que aconteceu.
Ao chegar á festinha, encontramos muitos amigos e foi muito divertido e por um acaso a Chelly apareceu pó lá com a irmã dela e isso mais divertido ainda...
Imagine duas super amigas numa festa? Fofocamos principalmente no banheiro a noite inteira e quando percebemos que os gatinhos estavam na festa, penso eu hoje que ficamos meio retardadas e em vez de dançar pertinho deles, ficávamos muito envergonhadas e resultado final?
Ninguém ficou com ninguém na festinha, apenas recebemos uma rosa vermelha que o nosso amigo Japa nos entregou e não contou nem sobre tortura quem mandou entregar e a minha prima e a irmã da Chelly também nunca contou, e sabe de uma coisa? Nós também não queríamos mesmo saber...
Hoje, ainda me lembro da chuva que também escorria de madrugada numa das janelas do salão de festas, assim como a chuva das janelas do anfiteatro e a chuva que escorre na janela do meu quarto quando eu estou tão sozinha e me perco em memórias como se fossem saudades que vêem fazer cócegas ao coração; saudades que vêem com o vento, mesmo vento que traz o cheirinho de chuva...